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Análise: experimento do MT vale para o Alto Paranaíba?

Rotação de culturas no cultivo de soja. Foto da Embrapa
Rotação de culturas é estratégica no cultivo de soja (Embrapa)

Experimento de 15 anos mostra efeitos da calagem e rotação de culturas na soja. Para professora da UFV-CRP, existem vantagens, porém com ressalvas

A convite do 100porcentoagro, a engenheira agrônoma Thaisa Fernanda Oliveira, doutora em Fitotecnia e professora adjunta da Universidade Federal de Viçosa, campus Rio Paranaíba (UFV-CRP), analisou se existe alguma relação entre as conclusões de um experimento realizado no Mato Grosso e a produção de soja no Alto Paranaíba. O experimento avalia diferentes sistemas produtivos envolvendo a calagem como uma das principais práticas para a produção da soja e de outras culturas no Cerrado mato-grossense. Atuando na área específica de Sistemas de Produção de Grandes Culturas, Thaísa Oliveira reconhece vantagens no manejo, mas faz algumas ressalvas e dá dicas importantes.

A calagem é considerada uma das melhores práticas de produção da soja e de outras culturas no Cerrado do Mato Grosso. Por conta disto, a Fundação de Apoio à Pesquisa Agropecuária de Mato Grosso (Fundação MT) vem desenvolvendo um experimento que avalia diferentes sistemas produtivos envolvendo o manejo desta prática. O experimento já dura 15 anos, e se divide em duas partes: Calagem na Cultura da Soja e Rotação de Culturas na Soja. 

Fazem parte do experimento Rotação de Culturas na Soja o monocultivo da oleaginosa — soja pousio e soja pousio com revolvimento; a sucessão de culturas com foco em soja  — milho, milheto e braquiária; e a rotação de culturas envolvendo soja, crotalária e milho safra ou segunda safra consorciado com braquiária, variando ao longo do tempo.

Por sua vez, o experimento Calagem na Cultura da Soja envolve três sistemas produtivos: monocultivo, sucessão e rotação de culturas. Também tem frequência de aplicação de calcário e nas doses de zero, duas, quatro e oito toneladas por hectare.

Felipe Bertiol, mestre em Ciência do Solo e pesquisador de Solos, Nutrição e Sistemas de Produção da Fundação MT, um dos responsáveis pelo experimento, diz que o objetivo da pesquisa é orientar o agricultor sobre o impacto de suas decisões na lavoura.

Nos seis primeiros anos do ensaio os sistemas não se diferenciaram. Se o experimento se encerrasse no sexto ano, a conclusão seria de que fazer palhada e degradar o solo não tinha diferença alguma. Porém, houve uma sucessão de acontecimentos que mudaram o rumo das análises. Um deles foi o aumento da população do nematoide de cisto da soja (Heterodera glycines). Com isso, as cultivares de ciclo menor e os vários episódios de déficits hídricos, os sistemas de sucessão e rotação de culturas passaram a se diferenciar dos monocultivos.

Bertiol explica que a diferença perdurou ao longo do tempo até atingir tetos produtivos na casa de 91 sacas por hectare em ano recorde. Onde foi inserida a braquiária, há três anos, houve elevação rápida e clara nos patamares produtivos do grão. Não é errado, mas, caso o produtor mantenha uma agricultura dita convencional, ou seja, com pousio e/ou revolvimento do solo, o cenário poderia ser devastador. Além disso, segundo o estudo, o milho, como cultivo de segunda safra, faz bem ao sistema e se equipara aos demais cultivos de cobertura testados, quando se fala em sucessão de culturas.

Em paralelo, a pesquisa demonstra a importância da rotação de cultivos no manejo de nematoides e também na promoção de melhores condições de palhada, que se destacam em anos com déficit hídrico. Bertiol sustenta que o tripé física-química-biologia tem grande impacto no potencial produtivo.

No caso do nematoide de cisto, o aumento nas doses de calcário e a falta de cobertura no ambiente, ou seja, de matéria orgânica, favoreceu muito a crescente das populações. A conclusão é da nematologista e pesquisadora da Fundação MT, Rosangela Silva, que acompanha o experimento desde o início. “Principalmente quando foi priorizado a cultivar de soja suscetível, pensando apenas na produtividade do material e deixando de lado o problema com os nematoides ocorrentes”, diz. Já no sistema rotacionado, a especialista destaca que as populações de cisto foram menores, devido à diversidade de cobertura e aumento de microrganismos antagonistas aos cistos. 

Após o longo experimento, considera-se que, mesmo em um ambiente diversificado para o nematoide de cisto, se a cultivar resistente não for priorizada haverá perdas na produtividade.

Vale para o Alto Paranaíba?

A conclusão do experimento se aplica à produção de soja no Alto Paranaíba? A pergunta foi feita pelo 100porcentoagro à Professora Thaisa Oliveira. Segundo ela, a calagem e a rotação de culturas são ferramentas de manejo muito importantes. O que se busca é uma produção maior e mais sustentável, mas, “está muito difícil conseguir aumento de produtividade. Isso não vem da parte genética, que tem um potencial muito alto. A soja, por exemplo, vem com um potencial genético de 300 ou mais sacas por hectare e, no campo, com muito esforço e dedicação, a gente faz 90, 100, 110 sacas, o que não é nem a metade do potencial”. A professora diz que o manejo experimentado no Mato Grosso traz muitas vantagens, mas há algumas ressalvas.

Clique aqui para ouvir a entrevista exclusiva de Thaísa Oliveira.

A pesquisadora da UFV conclui que é fundamental estudar muito bem as soluções técnicas para ver se realmente são vantajosas para o produtor. Quando se pensa em rotação de culturas, é um sistema que requer diversidade porque um sistema bem feito, bem planejado, preconiza que não se repita a mesma cultura na área por dois anos. A pesquisadora questiona se essa é a realidade regional do produtor e do mercado.