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Revista3-8

Tarifas dos EUA impactam agronegócio mineiro: prejuízo bilionário à vista

Setor agropecuário de Minas Gerais enfrenta perdas significativas com novas tarifas americanas, exigindo diplomacia e diversificação de mercados para mitigar danos econômicos e sociais

Nesta quarta-feira (6), as tarifas impostas pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros entraram em vigor, marcando um “Dia D” de incertezas para a economia nacional, especialmente para o agronegócio mineiro. Um estudo detalhado da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) projeta um cenário de perdas substanciais, com um impacto estimado de R$ 4,7 bilhões no Produto Interno Bruto (PIB) de Minas Gerais e a supressão de mais de 30 mil postos de trabalho em um prazo de até dois anos.

A economista da Fiemg, Juliana Gagliardi, esclarece que a análise abrange dois cenários distintos: um de curto prazo e outro de longo prazo. As projeções mais amplas indicam que, em um período de cinco a dez anos, os efeitos negativos podem se aprofundar, superando R$ 15,8 bilhões no PIB estadual e resultando na eliminação de mais de 172 mil empregos. Estes números sublinham a gravidade da situação e a necessidade de ações coordenadas para proteger a economia local.

Embora Minas Gerais consiga manter cerca de 37% de suas exportações isentas das novas tarifas – incluindo produtos como ferro fundido, ferro-nióbio e aeronaves –, a maior parte de sua pauta exportadora, precisamente 63%, permanece vulnerável à taxação. O café, um dos pilares do agronegócio mineiro, é um dos produtos mais afetados, representando 33% do total exportado pelo estado para os Estados Unidos. A inclusão do café na lista de produtos tarifados gera grande preocupação para produtores e exportadores, dada a relevância do grão para a balança comercial mineira.

… em um período de cinco a dez anos, os efeitos negativos podem se aprofundar, superando R$ 15,8 bilhões no PIB estadual e resultando na eliminação de mais de 172 mil empregos

Além do café, outros segmentos do agronegócio também sentem o peso das novas regras. Na siderurgia, apesar de algumas isenções, produtos como tubos de aço e fio-máquina de ferro ou aço continuam sujeitos às tarifas. A carne bovina, outro item de destaque na pauta exportadora de Minas Gerais, igualmente não foi contemplada com a isenção, o que adiciona mais um desafio para o setor pecuário do estado.

O presidente da Fiemg, Flávio Roscoe, expressa a preocupação do setor ao revelar que já há relatos de cancelamentos e rompimentos unilaterais de contratos, sob alegação de força maior. “Já há transtornos e discussões para a negociação de rompimentos de contratos”, afirma Roscoe. Ele também menciona a ocorrência de férias coletivas em algumas empresas. “Demissões ainda são precoces, pois as empresas estão avaliando estratégias, mas, com certeza, elas virão”, projeta o presidente.

Para Roscoe, o momento atual exige maturidade e um diálogo institucional robusto. “A imposição dessas tarifas, ainda que parcialmente suavizada pelas isenções, foi unilateral e sem negociação com o governo brasileiro. É fundamental que o Brasil atue diplomaticamente para ampliar o número de produtos isentos, preservar sua competitividade no mercado internacional e proteger empregos e investimentos nacionais”, avalia o dirigente, ressaltando a urgência de uma resposta governamental eficaz.

Agro em estado de alerta: a assessora técnica do Sistema Faemg Senar, Aline Veloso, confirma a gravidade da situação, afirmando que ela é “bastante delicada”. Veloso destaca que várias cadeias produtivas do agronegócio não foram incluídas na lista de exceções de produtos exportados pelo Brasil aos Estados Unidos. Entre os mais afetados, Aline Veloso aponta o café, o setor de carnes – com ênfase nas carnes bovinas – e diversas frutas, além de outros produtos da cadeia agropecuária, que agora enfrentam barreiras comerciais significativas.

Veloso informa que a Faemg Senar acompanha de perto os setores de café e carnes. Até o momento, a entidade não identificou impactos diretos como férias coletivas no setor produtivo. Contudo, ela observa uma readequação nas escalas de abate de alguns frigoríficos desde a semana retrasada. “O que tem se notado desde a semana retrasada é uma readequação nas escalas de abate de alguns frigoríficos. Mas isso não somente aqui em Minas Gerais, mas em nível Brasil”, explica Veloso, indicando uma reação generalizada do mercado à nova conjuntura.

O que fazer para superar a crise: a busca por soluções para a atual situação tarifária, conforme especialistas consultados pelo Diário do Comércio, aponta para a diplomacia e a diversificação de mercados externos, ou o fortalecimento do mercado doméstico para certos segmentos. Flávio Roscoe, da Fiemg, contudo, ressalta a dificuldade em abrir novos mercados em um momento de “distúrbio no comércio internacional criado pelos embates geopolíticos”.

A professora Carla Aguilar, coordenadora de análise insumo-produto da Fundação João Pinheiro (FJP), destaca que os impactos variam conforme a relevância do mercado dos Estados Unidos para cada produto. “No caso do mel, cerca de 75% são destinados ao mercado americano. Então, esse é um produto que vai sentir de maneira significativa a questão das tarifas estabelecidas pelos Estados Unidos”, observa Aguilar, evidenciando a vulnerabilidade de setores com alta dependência do mercado norte-americano.

Franz Petrucelli, professor de administração do Centro Universitário Newton Paiva, reforça a importância da diplomacia para resolver o impasse das tarifas. Além disso, ele sugere que o Brasil deve buscar diversificar sua atuação em outros mercados e fortalecer o mercado interno, criando alternativas para os produtos afetados pelas novas barreiras comerciais.

Carolina Rocha Batista, presidente do Conselho Regional de Economia de Minas Gerais (Corecon-MG), aponta que, apesar da perspectiva de que 63% da pauta mineira seja tarifada, “há sinais de respiro que podem orientar estratégias de mitigação”. Ela explica que “os dez principais produtos mineiros isentos da nova tarifa respondem por aproximadamente 98% do valor total das exportações isentas, o que aponta caminhos viáveis para minimizar os danos econômicos”.

Para Batista, uma das principais saídas para Minas Gerais reside no fortalecimento e na expansão da exportação dos produtos isentos. Isso implica em promover ganhos de escala, melhorias tecnológicas e aprimorar a competitividade internacional. “Além disso, é fundamental a diversificação dos destinos comerciais. Reduzir a dependência dos Estados Unidos significa buscar maior inserção em mercados alternativos”, enfatiza, sugerindo uma reorientação estratégica das exportações.

A professora Andrea Resende, de relações internacionais do Centro Universitário Una, reitera que a resposta à questão das tarifas deve ser similar à enfrentada em uma crise nos Estados Unidos: a diversificação. Ela aponta para novas oportunidades de mercado: “China e México já sinalizaram que estão abertos a importar produtos brasileiros, inclusive, o México se tornou o segundo maior exportador de carne bovinas. O consumo de café na China tem crescido muito nos últimos meses e, o Brasil, enquanto maior exportador de café do mundo pode e deve abocanhar este mercado”, destaca Resende, indicando o potencial de novos parceiros comerciais para o agronegócio brasileiro.

Marcelo Antônio Belisário, economista e presidente do Sindicato dos Despachantes Aduaneiros de Minas Gerais (Sdamg), concorda que a diplomacia é o meio mais eficaz para encontrar uma solução para a questão das tarifas. Ele também alerta para os impactos de uma possível retaliação por parte do governo brasileiro, uma vez que setores no Brasil dependem de insumos provenientes dos Estados Unidos, o que poderia gerar um ciclo de prejuízos mútuos.

Impacto nacional das tarifas: a Fiemg também realizou uma simulação do impacto das tarifas impostas pelos Estados Unidos em nível nacional. A estimativa é de uma redução no PIB brasileiro de R$ 25,8 bilhões no curto prazo, podendo atingir R$ 110 bilhões no longo prazo. A perda de renda das famílias pode chegar a R$ 2,74 bilhões em até dois anos, acompanhada da redução de 146 mil postos de trabalho formais e informais.

Os Estados Unidos são o segundo maior consumidor de produtos brasileiros, superados apenas pela China. Atualmente, dos US$ 337 bilhões exportados pelo Brasil, o país norte-americano contribui com 12% desse comércio. Em 2024, São Paulo liderou as exportações brasileiras para os Estados Unidos, com 33,6% do total, seguido pelo Rio de Janeiro, com 18,4%. Minas Gerais ocupa a terceira posição no ranking nacional, representando 11,4% das exportações destinadas ao país norte-americano.