Advogada explica exigências legais na construção de barragens para irrigação. Cíntia Nogueira é especialista em Direito no Agronegócio
Com a expansão de áreas irrigadas e a necessidade de um maior volume de água para irrigação, especialmente nas épocas de estiagem, os barramentos têm sido uma alternativa para os produtores rurais do Alto Paranaíba, em Minas Gerais. Porém, para estarem dentro da lei, é necessário cumprir alguns procedimentos burocráticos antes da construção, dentre os quais o licenciamento e a outorga pelo uso da água.
O processo de licenciamento para captação de água em barramento varia de acordo com o dimensionamento da barragem que se pretende implantar, segundo a advogada Cíntia Nogueira, especialista em Direito no Agronegócio. Cintia explica, ainda, que o licenciamento de barragens destinadas à irrigação, apesar de necessário, nem sempre deve ser um processo moroso. Na formalização do Processo, todos os aspectos ambientais do empreendimento serão analisados e o empreendedor deverá descrever sua atividade principal para o órgão. “O produtor deve detalhar quantos hectares ele pretende irrigar, apresentando todas as características, não só do projeto da barragem, mas, também, do imóvel como um todo”, diz. Precisa, também, informar quais captações de recursos hídricos o imóvel possui, se são captações superficiais, e qual é o tratamento atual dos efluentes líquidos. “Na verdade, trata-se de um retrato pormenorizado de todo o empreendimento e não somente da localização específica, onde se pretende conseguir a outorga da captação de água em barramento”.
Tanto a construção, quanto a instalação e o funcionamento dependem do licenciamento prévio. A especialista lembra que nenhuma atividade deverá ser executada antes de sua aprovação pelo órgão competente do Sistema Estadual do Meio Ambiente.
O processo é composto por três etapas: licenciamento prévio, de instalação e de operação.
O licenciamento prévio (LP) aprova a localização da barragem, atestando a sua viabilidade ambiental, e estabelece condicionantes para as fases seguintes de implantação.
A Licença de Instalação (LI) autoriza a obra, de acordo com especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados, fixando cronograma para a execução das medidas mitigadoras e da implantação dos sistemas de controle ambiental.
Já a Licença de Operação (LO) autoriza o início das atividades da obra, após a verificação do efetivo cumprimento das medidas de controle ambiental e condicionantes determinadas nas licenças anteriores.
Dependendo do porte da barragem, é preciso apresentar o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA). “Barragens de grande porte necessitam de um estudo aprofundado, o que significa a elaboração de um estudo sobre as condições da localização da barragem, a bacia em que o empreendimento está localizado, se haverá captação de corpos de água, se é uma unidade de conservação, entre outros detalhes e, com os resultados desse estudo o relatório é produzido, servindo de guia para o Parecer do órgão responsável, que vai possibilitar a concessão da licença”, afirma a advogada.
De acordo com o EIA-RIMA se determinam as condicionantes para a liberação da licença, que podem incluir a reposição florestal e/ou a compensação florestal e ambiental. “A reposição florestal dependerá do impacto da intervenção requerida, e se houve pedido de supressão de árvores, por exemplo. E para determinar as ações necessárias para compensar as intervenções ou possíveis danos considera-se a vulnerabilidade natural, que deve ser analisada e classificada como baixa, média ou alta. A apresentação, pelo empreendedor, de um plano com inventário florestal guiará o órgão licenciador nesse sentido.”
O plantio florestal para fins de reposição florestal deve ser realizado no mesmo Estado onde houve a supressão de vegetação. A reposição florestal é um mecanismo previsto pela Lei 12.651/12, que tem como finalidade manter o estoque de madeira dentro do Estado. Por seu turno, a compensação ambiental pode ser realizada de diversas formas: através de fixação do valor a ser desembolsado – que deverá ser investido, pelo órgão ambiental, em ações ambientais – ou em ação direta, com a realização de atividades de compensação, definidas pelo órgão licenciador.
O inventário florestal deve ser assinado pelo profissional responsável habilitado para este tipo de trabalho. É o caso dos profissionais da área ambiental: engenheiro ambiental, biólogo, engenheiro florestal ou agrônomo. Nele devem constar informações referentes ao levantamento das árvores presentes na área, com detalhamento de nome popular e científico de cada indivíduo, altura, diâmetro, circunferência, área basal, volume, localização, além de outras informações, como as características específicas de qualidade fitossanitária e importância ecológica do indivíduo suprimido. Neste último caso, podemos trazer como exemplo as espécies endêmicas – que são aquelas que só existem naquela área ou região – as espécies raras, espécies de grande importância ecológica para a manutenção de polinizadores, ou outros exemplos, como o caso de árvores “porta-sementes” ou árvore matriz, que são aquelas de grande importância para a produção de sementes com qualidade genética para que indivíduo supere intempéries climáticas ou ataques de pragas e doenças até alcançar a maturidade, garantindo o ciclo reprodutivo da espécie.
Cíntia Nogueira aponta alguns casos de licenciamento simplificado, por meio do Sistema de Licenciamento Ambiental (SLA), disponível no site da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD). “A documentação varia conforme o porte e o enquadramento do empreendimento, e a cada fase do empreendimento”. Serão comuns a todas as modalidades de licenciamento os documentos de identificação do empreendedor e, em caso de terceiros, a procuração acompanhada de documentos. Além disto, é preciso juntar os dos formulários preenchidos de licenciamento — fornecidos pelo órgão, a outorga de água, o croqui de localização, o mapa da propriedade, o registro do imóvel e outros especificados em cada formulário e na etapa correspondente.
A outorga pelo uso da água é um dos instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos, Lei 9433/97, para a gestão das águas, e faz parte dos mecanismos de controle de uso dos recursos hídricos que têm, entre seus objetivos, promover a garantia do uso racional das águas e minimizar conflitos pelo seu uso.
Cíntia Nogueira explica que esta é uma das etapas do licenciamento, mas deve ser solicitada antes da instalação da barragem. Em Minas Gerais, quem faz a análise da outorga são as Unidades Regionais de Gestão das Águas do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM). Atualmente, o Processo é totalmente digital, mediante cadastro eletrônico no Sistema Eletrônico de Informações (SEI). Antes do cadastro, o empreendedor deverá providenciar a documentação necessária, que consiste no preenchimento dos formulários disponibilizados pelo IGAM, recolhimento das taxas para análise dos processos de outorga, documentação do requerente, Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) do responsável pelo processo de outorga, entre outras exigências burocráticas, que podem ser conferidas no próprio sistema.
A outorga é exigida para qualquer intervenção que venha a alterar o regime, a quantidade ou a qualidade de um corpo de água.
Para os barramentos realizados sem passar por esse processo de licenciamento, a advogada alerta que “todos os empreendimentos ou usuários que possuam barragens em curso de águas, não somente aquelas destinadas a irrigação, deverão ser cadastrados no SEI, inclusive aqueles que não as utilizam, mas têm o direito real sobre a terra onde estão localizadas. A regularização de um empreendimento que não passou pelo licenciamento se inicia com o cadastro e segue os procedimentos similares aos de um novo licenciamento.”
Diante dos aspectos legais relacionados aos barramentos, a advogada esclarece que “as intervenções ambientais realizadas pelo produtor rural, não apenas de barramento, se tornarão mais seguras se, anteriormente à tomada de qualquer decisão, for feita uma consulta às normativas dos órgãos ambientais, específicas para cada região.”
Cíntia Nogueira conclui: “Não é incomum que uma permissão para captação de água, por exemplo, seja suprimida pelo órgão ou suspensa em determinada localidade, sem qualquer aviso aos usuários, o que geraria inconvenientes como multas e afins. O direito ambiental sempre funcionará melhor na modalidade preventiva. Remediar quase sempre é muito difícil. A escolha de uma consultoria confiável, seja técnica e/ou jurídica, é um instrumento de grande valia para o produtor rural.”
Em qualquer caso, para a solicitação da outorga, do licenciamento e, inclusive, a obtenção de crédito rural para o empreendimento, a propriedade onde o barramento será realizado deverá estar inscrita no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e cumprir as exigências legais relativas às Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal, conforme exigido pela Lei 12.651/2012, a Lei de Proteção Florestal.
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