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Revista3-8

Isenção chega ao fim: LCAs e LCIs serão taxadas e aumentos atingem fintechs e empresas de apostas

Pedro Lupion (PP-PR), presidente da FPA (Crédito: Agência FPA)
Pedro Lupion (PP-PR), presidente da FPA (Crédito: Agência FPA)

Fim da isenção sobre LCAs e LCIs gera reação do agro e do mercado financeiro; governo busca ampliar arrecadação e compensar corte no IOF

Depois de semanas de incertezas, o governo federal oficializou a revisão de incentivos tributários e modificações no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O anúncio seguiu-se a uma reunião de quase seis horas realizada na noite do domingo, 8 de junho, entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e os líderes do Congresso Nacional — Hugo Motta, da Câmara dos Deputados, e Davi Alcolumbre, do Senado.

O encontro consolidou um acordo: o governo vai reduzir o IOF sobre operações de crédito, com destaque para aquelas de risco sacado — operações em que fornecedores antecipam o recebimento de valores a receber. Como contrapartida, a proposta prevê aumento de impostos sobre fintechs, empresas de apostas e o fim da isenção de Imposto de Renda para investidores em Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs).

Grupo Lisboa Agro

Fim da isenção de IR sobre LCAs e LCIs, aumento de alíquotas para fintechs e empresas de apostas e corte no IOF sobre risco sacado compõem novo pacote fiscal costurado entre Executivo e Congresso. Mudanças afetam diretamente o financiamento ao agro e ampliam a carga para setores estratégicos da economia

A medida foi apresentada como parte de uma estratégia para reduzir em 10% os chamados “gastos tributários infraconstitucionais” — benefícios fiscais concedidos por lei ordinária e que, segundo o governo, devem gerar renúncia estimada em R$ 500 bilhões neste ano. A Fazenda já sinalizou que haverá nova reunião voltada ao corte de despesas primárias, mas ainda sem data definida.

Impacto direto no crédito rural

Entre as entidades que reagiram com preocupação, destaca-se a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). Em nota oficial, a entidade afirmou que a proposta de tributar em 5% os rendimentos de LCAs e LCIs “compromete uma fonte essencial de crédito rural, especialmente para médios produtores e cooperativas”. Segundo a FPA, a taxação tende a encarecer o financiamento agrícola, com impacto direto sobre o preço dos alimentos.

A nota da FPA detalha que aproximadamente 42% do financiamento da safra brasileira já provém de fontes privadas e, dentro desse total, cerca de 43% são originados em LCAs. Em abril de 2025, esses títulos somaram R$ 559,9 bilhões. Já o estoque de LCIs e LCAs na B3, no primeiro trimestre de 2025, alcançou R$ 979,1 bilhões — montante expressivo com destinação significativa ao agronegócio.

A entidade também criticou o foco do ajuste fiscal apenas sobre a arrecadação, “sem enfrentar despesas obrigatórias nem revisar privilégios”. Destacou que, enquanto LCIs e LCAs serão taxadas, “outros títulos permanecem isentos, sem critérios claros que justifiquem a diferenciação”.

Para a FPA, penalizar o agronegócio significa penalizar o crescimento nacional: “O agro é responsável por quase metade do superávit comercial brasileiro. É preciso equilíbrio: ajustar as contas passa pelo controle de gastos e pela revisão estrutural do orçamento, e não pelo aumento do peso sobre quem sustenta a economia.”

Repercussão no mercado financeiro

No mercado financeiro, a proposta gerou desconforto entre analistas e investidores. Para Sidney Lima, da Ouro Preto Investimentos, “as LCIs e LCAs são amplamente utilizadas por investidores conservadores, principalmente pela vantagem tributária. Sem a isenção, perdem competitividade frente a outros produtos de renda fixa. Isso pode gerar uma barreira emocional e recuo por parte do investidor pessoa física”.

Além do impacto no investidor, a decisão pode pressionar emissores dos papéis, que precisarão elevar as taxas oferecidas para manter a atratividade, elevando assim o custo de funding para setores como agropecuária e construção civil.

Jeff Patzlaff, planejador financeiro e especialista em investimentos, considera que a medida visa “gerar alívio parcial no custo do crédito corporativo e sinalizar compromisso com a responsabilidade fiscal”. No entanto, ressalta que a estratégia reforça a dependência de tributos indiretos e ajustes pontuais: “Isso gera instabilidade e incerteza nas regras do jogo, dificultando o planejamento de empresas e investidores”.

Mudanças recentes nas regras

Em paralelo a essas alterações, o governo já havia promovido outra mudança relevante nos prazos mínimos para aplicação em LCIs e LCAs. Em 2024, o período mínimo foi ampliado de 90 dias para 12 meses, e depois reduzido para 9 meses — medida interpretada como tentativa de ajustar o fluxo de capital no mercado de renda fixa.

As medidas divulgadas reforçam a percepção de reconfiguração na política fiscal, focada em aumento de arrecadação e revisão de incentivos. Embora haja expectativa de novos anúncios voltados à contenção de despesas, o pacote atual atinge diretamente setores estratégicos como o agronegócio, principal fonte de superávit da balança comercial brasileira