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O bem-estar como bússola na agricultura regenerativa

Gerado por IA (Google Gemini)
Gerado por IA (Google Gemini)

POR LORENA MANGABEIRA — Esses dias, fazendo uma busca para a minha pesquisa, me deparei com um artigo científico que tinha o seguinte tema: “Regenerative farming and human wellbeing: Are subjective wellbeing measures useful indicators for sustainable farming systems?”, traduzindo: “Agricultura regenerativa e bem-estar humano: medidas subjetivas de bem-estar são indicadores úteis para sistemas agrícolas sustentáveis?”. Lógico que eu leria. O título me chamou atenção porque unia duas palavras que vêm guiando minha caminhada nos últimos anos: agricultura regenerativa e bem-estar.

O artigo, publicado em 2021 por Kimberly Brown, Jacki Schirmer e Penney Upton, parte de uma pergunta simples, mas poderosa: como medir o sucesso de um sistema agrícola sustentável? Por décadas, avaliamos o desempenho das propriedades rurais pelos indicadores de produtividade, lucro e eficiência. Mas os autores propõem um olhar mais completo — e mais humano: incluir as medidas de bem-estar subjetivo como parte dos indicadores de sustentabilidade, ou seja, entender não apenas quanto a fazenda produz, mas como as pessoas que vivem e trabalham nela se sentem.

Essa perspectiva muda tudo.

Ao avaliar fazendas que adotam práticas regenerativas — como a rotação de culturas, o uso de cobertura vegetal, o manejo integrado de pastagens e a redução de insumos químicos — o estudo revelou que esses sistemas não apenas restauram o solo e aumentam a biodiversidade, mas também melhoram a qualidade de vida e o senso de propósito dos agricultores.

Os produtores entrevistados relataram sentir mais satisfação, mais conexão com a natureza e mais orgulho do que faziam. O trabalho passou a ser visto não como uma luta constante contra a escassez, mas como um ato de cuidado e contribuição para o futuro.

Isso nos faz pensar: talvez a verdadeira medida de uma fazenda saudável não esteja apenas na colheita ou no faturamento, mas na plenitude das pessoas que a constroem todos os dias.

Quando o agricultor se sente parte de um ciclo vivo — quando reconhece que seu trabalho regenera o solo, alimenta pessoas e preserva o planeta — ele acessa um tipo de bem-estar que não cabe nas métricas tradicionais. É o bem-estar que nasce do sentido e da coerência entre o que se faz e o que se acredita.

… talvez a verdadeira medida de uma fazenda saudável não esteja apenas na colheita ou no faturamento, mas na plenitude das pessoas que a constroem todos os dias

Os autores chamam isso de dimensão eudaimônica do bem-estar — aquela que está ligada à realização pessoal, ao propósito e à contribuição para algo maior. É diferente do prazer momentâneo; é a sensação profunda de estar no lugar certo, fazendo o que tem valor. E isso, curiosamente, é o que muitos produtores descrevem quando falam da agricultura regenerativa: um retorno às origens, um reencontro com o ritmo natural da vida e um resgate da alegria de produzir com propósito.

Trazer os indicadores de bem-estar humano para dentro da gestão rural é reconhecer que pessoas felizes, seguras e realizadas tomam decisões mais conscientes e sustentáveis, algo que reforço e desenvolvo muito nas minhas mentorias com as produtoras rurais.

Isso se reflete em tudo: na forma como a equipe se relaciona, na paciência com os processos naturais, na disposição para inovar e até na harmonia familiar. O bem-estar, nesse sentido, não é apenas um resultado — é também uma ferramenta de gestão. Ele aponta se o caminho trilhado está, de fato, regenerando a vida em todas as suas formas.

Penso que a agricultura regenerativa é, no fundo, um espelho da própria natureza humana. Assim como o solo precisa de tempo para se recompor, nós também precisamos de pausas, de sentido, de relações saudáveis e de pertencimento. Uma fazenda que cultiva esses valores cria um ecossistema onde a produtividade e a felicidade crescem juntas, como raízes que se fortalecem mutuamente debaixo da terra.

Por isso, talvez o próximo grande salto da agricultura regenerativa não esteja apenas na técnica, mas na forma de olhar para as pessoas!!

Se começarmos a medir o sucesso de uma propriedade pelo equilíbrio entre produtividade, saúde do solo e bem-estar humano, estaremos dando um passo verdadeiro rumo à sustentabilidade.

Regenerar não é apenas restaurar o que foi degradado — é reconectar o humano àquilo que o faz vivo.