Importação de leite e derivados da Argentina e Uruguai ameaça a atividade no Brasil. Existe risco real de pequenos e médios produtores desistirem da atividade, e preço para o consumidor final pode aumentar no futuro. Saiba o que pensa o maior produtor de Minas e 4º maior do Brasil
Centenas de produtores de leite e líderes de entidades representativas se reuniram em Brasília para discutir a crescente importação de lácteos, especialmente da Argentina e do Uruguai. Com os aumentos nos custos de produção enfrentados pelos brasileiros, a busca por leite no mercado internacional tem proporcionado uma concorrência desleal, ameaçando milhares de pecuaristas e postos de trabalho.
Em 2023, somente no primeiro semestre, o país já comprou 1,23 milhão de litros de leite, indicando a possibilidade de quebrar o recorde de importações de lácteos. A iniciativa foi organizada pela Frente Parlamentar em Apoio ao Produtor de Leite (FPPL), com apoio da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (FAEP), Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), da Associação Brasileira dos Produtores de Leite (Abraleite) e da Organização das Cooperativas do Brasil (OCB), entre outras entidades.
Para a presidente da FPPL, Ana Paula Leão, a valorização da cadeia do leite passa necessariamente pela defesa comercial, porque existe concorrência desleal. Enfrentamos a pior crise da pecuária nacional de leite, a importação predatória do produto, notadamente da Argentina e do Uruguai, principal causa da dramática situação da pecuária leiteira nacional, cresceu muito nos últimos meses. É preciso medidas para mitigar essa situação e proteger os produtores brasileiros.
O mercado de leite no Brasil vem passando por mudanças significativas desde 2021, com a saída de vários produtores da atividade e redução do rebanho em diversos estados do país. Em 2022, os altos preços intensificaram-se com a entrada da entressafra, comprometendo o consumo do produto pela população. Diversos fatores influenciaram diretamente os preços praticados, como a redução da produção nacional, a alta dos preços dos principais itens da alimentação do gado, o fenômeno La Niña, a mudança crescente de parte do sistema produtivo do gado para confinamento, chuvas fortes na região Sudeste, a inflação, o aumento dos preços dos combustíveis e a ascensão da cotação do dólar. A análise está no artigo “Panorama do Mercado de Leite em 2023: Análises e Indicadores do Agronegócio”, publicado por Rosana de Oliveira Pithan e Silva, em plataforma do Instituto de Economia Agrícola de São Paulo.
A redução da produção de leite formal em 2022 levou à necessidade do aumento nas importações, que subiram 26,3%, representando 10% do total consumido internamente, o que é preocupante. A concentração da produção é um fator que vem crescendo, com 2% dos estabelecimentos produzindo 30% do leite do país. Isso pode trazer instabilidade nos preços para o consumidor, com possibilidade de criação de cartéis que passem a controlar o mercado, com redução da concorrência e a prática de preços mais elevados.
A necessidade de políticas públicas para os médios e pequenos produtores é fundamental para garantir sua participação na produção e evitar problemas sociais. Quanto à questão climática, a entrada do El Niño pode ser um fator preocupante para algumas regiões.
A implantação de tecnologias digitais é uma oportunidade para alcançar maior produtividade e eficiência na produção de leite, mas é preciso investimentos e políticas públicas efetivas para atender os pequenos produtores. A consideração da questão climática na agropecuária é outra necessidade urgente.
A expectativa é que a melhora da economia brasileira atue positivamente sobre o mercado de leite, com a retomada do consumo de produtos básicos como o leite, diminuição dos custos de produção, retomada dos estoques reguladores e queda das cotações do dólar. Espera-se que a região do Sul do Brasil retome sua produção, influenciando positivamente a disponibilidade do leite e interrompendo o ciclo de importações de lácteos dos vizinhos do Mercosul.
Makoto Sekita, da Sekita Agronegócios (São Gotardo e Rio Paranaíba/MG), considera urgente uma tomada de posição do Governo Brasileiro. A Sekita é a maior produtora mineira de leite e quarta maior produtora do Brasil, com 75.327 litros/dia em 2022 — o primeiro colocado do ranking é a Fazenda Colorado (Araras/SP), seguida da Melkstad Agropecuária (Carambeí/PR) e Orostrato Olavo Silva Barbosa (Tapiratiba/SP).
Para Makoto, a importação de leite argentino e uruguaio realmente prejudica o produtor brasileiro. “Se o Governo não tomar uma providência, vai matar a galinha dos ovos de ouro”. Muitos produtores vão desistir, se não houver uma mudança de rumos. A continuar como está, o quadro pode piorar porque argentinos e uruguaios não têm como suprir a demanda brasileira.
Na avaliação de Makoto, se os pequenos e médios deixarem a atividade, no futuro próximo poderá haver uma alta significativa do leite no mercado nacional porque vai faltar leite. “O Governo tem que criar cotas para a importação de leite porque, do contrário, a situação vai se complicar”, conclui.