
POR LORENA MANGABEIRA — Durante os estudos para o mestrado, deparei com algumas teorias humanistas do século passado (1925) que me levaram a refletir sobre a conexão com a agricultura regenerativa e sobre como os produtores podem fazer uma gestão focada também nas pessoas. A princípio, essas ideias pareciam pertencer ao mundo das fábricas e das grandes cidades, mas bastou um olhar mais atento para perceber o quanto elas se aplicam à vida no campo — afinal, não existe solo fértil sem relações saudáveis.
Essas teorias surgiram num tempo em que a produtividade era medida apenas em números. Com o passar dos anos, estudiosos começaram a perceber que o verdadeiro motor das organizações não era a máquina, mas o ser humano. Descobriram que o cuidado, o pertencimento e a valorização são forças invisíveis capazes de transformar o ambiente de trabalho — e os resultados.
E é exatamente isso que a agricultura regenerativa faz quando olhamos para ela além das técnicas: ela nos convida a regenerar também as relações.
Em uma fazenda, a gestão humanizada começa quando o produtor entende que cada pessoa — do campo ao escritório — é parte viva do ecossistema da propriedade. Quando há espaço para diálogo, quando as decisões são compartilhadas e quando o reconhecimento se torna parte da rotina, nasce um clima de confiança e propósito que transborda em todos os processos.
As pessoas passam a trabalhar com mais sentido, e a produtividade acontece quase como um efeito natural, assim como o solo responde quando é bem cuidado.
Cuidar das pessoas é cuidar da terra.
Uma equipe respeitada e ouvida tende a se engajar mais, a propor soluções criativas e a manter o olhar atento ao que precisa ser ajustado. O ambiente emocional da propriedade influencia diretamente a qualidade das decisões, o ritmo de trabalho, o bem-estar das famílias e até o desempenho produtivo. É por isso que gestão e agricultura regenerativa são duas faces do mesmo processo: quando o produtor cuida das relações, ele está fortalecendo as raízes da sua própria fazenda.
O que se chama hoje de “liderança humanizada” é, na verdade, a habilidade de reconhecer o valor de cada pessoa e permitir que ela se desenvolva. Um líder regenerativo, me permitindo criar esse termo, não precisa controlar cada detalhe; ele confia, escuta, incentiva e inspira. Isso cria um ciclo virtuoso onde todos crescem — o solo se renova, as pessoas florescem e a propriedade prospera.
Produzir com humanidade é o caminho mais bonito e duradouro para cultivar prosperidade
A agricultura regenerativa tem nos ensinado que a terra responde ao tipo de energia que colocamos nela. O mesmo vale para as relações humanas. Onde há confiança, floresce a cooperação; onde há propósito, surge o engajamento; onde há respeito, nasce o bem-estar. E bem-estar, nesse contexto, não é luxo — é indicador de sustentabilidade e de produtividade.
Ao olhar para o futuro, fica cada vez mais claro que a gestão das propriedades rurais não pode se resumir a planilhas, metas e prazos. O novo modelo de gestão — aquele que gera resultados duradouros — é aquele que combina técnica e sensibilidade, razão e empatia, produção e propósito.
É o modelo em que o produtor se reconhece como guardião de um ecossistema humano e natural, e entende que regenerar o solo e regenerar as relações são tarefas inseparáveis.
A boa gestão é como um solo fértil: acolhe, nutre e dá espaço para que a vida floresça. E quando a vida floresce — nas pessoas, nas famílias e na terra — a fazenda inteira se torna um organismo vivo, pulsante e produtivo.
Talvez essa seja a verdadeira essência da agricultura regenerativa: um modo de produzir que cura o solo e, ao mesmo tempo, cura as relações humanas que o sustentam.